Condição influencia as decisões de consumo, alimenta a ansiedade e dificulta o reconhecimento da própria situação
A dismorfia financeira ganha espaço no debate sobre comportamento e saúde econômica porque traduz em palavras a dificuldade que muitas pessoas têm em avaliar com clareza a própria situação. O termo é inspirado na dismorfia corporal, que ocorre quando há uma percepção distorcida da própria imagem, e aponta para a mesma lógica, só que relacionada ao dinheiro. Ele engloba tanto aqueles que vivem com uma sensação constante de insegurança, desenvolvendo medo de gastar, quanto aqueles que adotam um estilo de vida incompatível com sua renda, mantendo padrões de consumo incompatíveis com a renda e que colocam sua estabilidade financeira em risco.
Neste segundo caso, que é o mais comum, a manifestação do comportamento aparece em decisões cotidianas, como usar o cartão de crédito sem planejamento, recorrer a empréstimos para manter o estilo de vida, ignorar contas ou extratos e acreditar que a situação está sob controle, mesmo diante do acúmulo de parcelas e compromissos. O hábito de viver sempre no limite se torna tão natural que a pessoa deixa de enxergar os sinais de desequilíbrio.
“Quando o consumo se transforma em uma válvula de escape para frustrações, a dismorfia financeira ganha força. A pessoa cria uma ilusão de estabilidade que não existe e compromete o futuro ao ignorar o presente”, explica a especialista em educação financeira Adriana Ricci.
Entre os fatores que alimentam esse comportamento estão as pressões emocionais, crenças familiares, busca por aceitação social e a comparação constante com padrões irreais, amplificados pelas redes sociais. A geração Z, especialmente, é impactada diariamente por vitrines digitais que estimulam o consumo impulsivo e reforçam a ideia de que é preciso acompanhar estilos de vida que não correspondem à realidade de boa parte dos jovens.
Sem consciência do que de fato entra e sai da conta, os impactos não se limitam às finanças. “A dismorfia financeira compromete a saúde mental, provoca ansiedade e interfere em decisões de longo prazo, como investimentos, planejamento de carreira ou a simples organização do orçamento doméstico”, alerta Adriana.
Em outra face do problema, essa desconexão com a realidade econômica pode gerar medo de gastar mesmo quando há recursos disponíveis, sensação de culpa diante de despesas planejadas, dificuldade em reconhecer conquistas materiais e comparação constante com padrões externos. “A pessoa sente que está em desvantagem ou em risco de perder tudo a qualquer momento, ainda que os números comprovem o contrário, e isso igualmente afeta decisões de consumo e investimentos, compromete planos de longo prazo e ainda pode gerar uma sobrecarga emocional”, explica.
Para a especialista, que tem mais de 25 anos de experiência no mercado financeiro, a conscientização é o primeiro passo para sair desse ciclo. “É preciso reconhecer que existe um descompasso entre a realidade e a percepção. Superar essa distorção exige estratégias com aspectos financeiros e emocionais. O autoconhecimento surge como ferramenta central ao lado da educação financeira, que oferece instrumentos práticos para lidar com dívidas, planejar gastos e estabelecer prioridades. Reconhecer a própria vulnerabilidade é o primeiro passo para ajustar escolhas, recuperar o equilíbrio e evitar que a percepção distorcida continue a guiar a vida econômica”, finaliza Adriana Ricci.
Sobre a especialista:
Adriana Ricci é especialista em investimentos e tem 25 anos de atuação no mercado financeiro. É fundadora, gestora e head de Operações da SHS Investimentos, empresa que atua no mercado financeiro desde 2008 e possui 2 unidades, sendo a sede em São José dos Campos, SP.
Possui certificações pela Ancord como Assessora de Investimentos, pela Anbima no PQO, Programa de Qualificação Operacional da Bolsa de Valores, e CPA-20, e pela Febraban, a FBB-100. Bacharel em Administração e Financista, pós-graduada com MBA em Finanças, Auditoria e Controladoria pela FGV.