por José Piñeiro
A safra 2025/26 da cana-de-açúcar está com um sinal de alerta. Segundo levantamento da NovaCana, a média das projeções indica moagem de 596 milhões de toneladas, uma queda de 4,1% em relação ao ciclo anterior. O cenário é agravado por um ATR (Açúcares Totais Recuperáveis) mais baixo, reflexo de condições climáticas adversas, e pressiona diretamente a produção de etanol e açúcar, dois pilares tradicionais do setor.
Esse movimento evidencia a vulnerabilidade do modelo baseado apenas em biocombustíveis e commodities. Ao mesmo tempo, reforça a urgência de fortalecer um ativo muitas vezes subestimado, que é a bioeletricidade produzida a partir do bagaço e da palha da cana.
Além disso, a EPE já apontou que, em 2024, a cogeração a partir da biomassa da cana garantiu aproximadamente 37 TWh de eletricidade, equivalente a 56% da produção da usina de Itaipu. Esse volume não apenas complementa a matriz elétrica nacional, como reduz a necessidade de acionar termelétricas fósseis, mais caras e poluentes. No mesmo ano, a biomassa respondeu por 8,2% da geração elétrica brasileira, consolidando-se como a quarta fonte renovável mais relevante, atrás apenas da hídrica, eólica e solar.
Além disso, o valor estratégico da bioeletricidade está na complementaridade sazonal. A safra de cana coincide com o período seco, quando os reservatórios hidrelétricos ficam pressionados. Isso transforma as usinas sucroenergéticas em fornecedoras de confiabilidade para o Sistema Interligado Nacional (SIN).
Da mesma forma, a bioeletricidade possui a curva de geração definida e previsível, ao contrário da geração solar ou eólica, sujeitas a variabilidade climática. Essa característica é fundamental para garantir a estabilidade do sistema.
Oportunidade de negócio e de política pública
Vale ressaltar que o potencial da bioeletricidade é ainda maior do que o já entregue. Para o setor sucroenergético, pressionado por margens menores no açúcar e no etanol, a venda de energia elétrica representa diversificação e estabilidade na receita. Para o país, é um instrumento de segurança energética e descarbonização.
Dessa forma, a safra 2025/26 lembrou que açúcar e etanol não são suficientes para sustentar sozinhos o setor sucroenergético. Ao contrário, a bioeletricidade se projeta como o verdadeiro pilar de estabilidade, tanto para o sistema elétrico nacional, quanto para o futuro econômico das usinas.
Investir em políticas que valorizem essa fonte, como remuneração pela capacidade firme, proximidade dos grandes centros consumidores e confiabilidade nas projeções de geração, permite transformar uma vocação em estratégia.
O Brasil não pode abrir mão de um ativo que gera energia limpa, reduz emissões e garante estabilidade. A bioeletricidade da cana deixa de ser apenas uma alternativa para se tornar o futuro da segurança energética do país.
Sobre José Piñeiro: Executivo com 24 anos de experiência no setor de energia, sendo 14 no setor sucroenergético. Atuou em cargos de liderança na Bunge Brasil, BP Bunge e bp bioenergy, com foco em estratégias comerciais e gestão de energia. MBA Executivo pela Fundação Dom Cabral.
Sobre a Tria Energia: comercializadora que atua no Ambiente de Contratação Livre (ACL) com portfólio completo de comercialização, gestão e trading. Com governança, capital e know-how respaldados pelo Pátria Investimentos, a Tria oferece flexibilidade contratual, gestão ativa, estruturas financeiras e suporte consultivo para viabilizar economia, previsibilidade e descarbonização.