Advogado explica cuidados essenciais para manter a conformidade e proteger o patrimônio em aplicações externas
Quando falamos em investimentos internacionais, os riscos fiscais aumentam significativamente, principalmente pelo complexo cenário tributário brasileiro. Segundo o Banco Central, os ativos de brasileiros fora do país somaram US$ 654,5 bilhões em 2024, declarados por mais de 29 mil pessoas físicas e jurídicas. A quantidade de investidores reflete o crescente interesse dos brasileiros por aplicações no exterior, mas as constantes mudanças na legislação e a complexidade do sistema brasileiro exigem atenção redobrada à conformidade fiscal e ao cumprimento das obrigações junto à Receita Federal e ao Banco Central.
Em setembro de 2025, o Senado Federal aprovou a segunda etapa da Reforma Tributária (PLP nº 108/2024), que cria o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). A transição gradual ocorrerá entre 2026 e 2033, substituindo os tributos atuais sobre consumo, embora prazos e detalhes ainda possam ser ajustados.
Em meio às mudanças, André Peniche, advogado especialista em direito tributário internacional, destaca que muitos brasileiros ainda deixam de cumprir corretamente obrigações fiscais e cometem equívocos estratégicos que podem gerar custos elevados ou autuações. “As mudanças representam um divisor de águas para quem investe no exterior. É preciso atenção redobrada neste período em que regras antigas e novas convivem lado a lado”, afirma.
Investidores que deixam de reportar seus ativos fora do país à Receita Federal ou ao Banco Central correm o risco de enfrentar multas que podem chegar a 10% do valor não declarado, além de autuações por omissão de rendimentos. Segundo a Instrução Normativa nº 2.133/2023, todas as aplicações, contas bancárias, imóveis e participações societárias mantidas fora do Brasil devem ser declaradas, independentemente do país de origem. Quem possui ativos no exterior superiores a US$ 1 milhão deve preencher a Declaração de Capitais Brasileiros no Exterior (CBE), enquanto aqueles com valores acima de US$ 100 mil precisam apresentar a declaração anual simplificada.
“A recente atualização da legislação exige que todos os bens e direitos no exterior sejam informados com base nas regras do Imposto de Renda e nas normas do Banco Central. Não cumprir essas obrigações pode gerar problemas sérios, inclusive na repatriação de valores”, orienta André Peniche.
A tributação da variação cambial sobre investimentos no exterior tem gerado controvérsias. A revogação do artigo 24 da MP 2.158-35/01, que previa isenção do Imposto de Renda sobre ganhos obtidos apenas com a variação da moeda estrangeira, não garante isenção automática para todos os casos, especialmente quando os rendimentos originais foram auferidos em moeda estrangeira.
“Nem toda valorização cambial representa lucro isento. Quando os recursos são aplicados em títulos, fundos ou ações no exterior, a variação positiva do câmbio deve ser tributada junto com o ganho de capital. Já nos casos em que a moeda foi apenas mantida em conta corrente, sem rendimento, aí sim pode haver isenção. É fundamental ter contabilidade precisa e um assessor especializado para definir o enquadramento correto e evitar autuações”, explica Peniche.
Investidores que aplicam recursos fora do país podem ser tributados duas vezes sobre o mesmo rendimento: no Brasil e no país onde o investimento foi realizado. Atualmente, o Brasil mantém cerca de 35 acordos de bitributação em vigor, abrangendo destinos como Portugal, Reino Unido, Japão e Emirados Árabes Unidos.
“Muitos brasileiros deixam de aplicar esses mecanismos por desconhecimento e acabam pagando mais do que deveriam. Antes de investir, é essencial analisar o tratado entre os países e registrar corretamente o imposto pago lá fora para compensação na declaração de IR”, alerta Peniche.
O uso de holdings, trusts ou outras estruturas em jurisdições com tributação favorável exige planejamento detalhado. Além das obrigações de reporte ao Banco Central (CBE) e à Receita Federal, estruturas mal montadas podem ser reclassificadas pelas autoridades fiscais como operação artificiosa, acarretando multas elevadas, bloqueio de ativos e até investigação criminal por evasão de divisas.
“Não basta apenas ‘abrir uma conta no exterior’. Existem riscos de aplicação de regras de preços de transferência e de tributação imediata sobre lucros atribuíveis a controladas no exterior quando não houver substância econômica suficiente. Transparência e substância são fundamentais para reduzir riscos e preservar o investimento”, orienta Peniche.
Com a implementação da Reforma Tributária, que introduziu o novo IBS e a CBS, é fundamental que investidores estejam atualizados sobre as alterações que impactam os investimentos estrangeiros. A falta de conformidade pode levar a custos adicionais e riscos fiscais.
“É fundamental entender como as novas medidas alteram a tributação sobre operações internacionais e ajustar estratégias de compliance e planejamento fiscal para evitar custos inesperados ou problemas com a Receita Federal”, conclui André Peniche.
Sobre André Peniche
André Peniche, com mais de 20 anos de experiência no mercado, é sócio-fundador da Murta Peniche Sociedade de Advogados, liderando as áreas de planejamento tributário e investimentos. Com passagens por grandes instituições financeiras e empresas, André se destaca pela sua expertise em otimização fiscal e pela atuação no mercado global, com foco em investimentos internacionais e expansão de negócios. Além disso, é Introducing Broker e Money Manager para o Swissquote Bank, oferecendo soluções inovadoras no setor financeiro