Cidades de Minas Gerais com média de temperaturas mínimas diárias de 21,2 °C tiveram mais casos de dengue em um período de dez anos, é o que aponta um estudo realizado por pesquisadores da UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora).
Os resultados da pesquisa foram publicados nesta segunda-feira (25), na revista Cadernos da Saúde Pública. Minas Gerais é um dos locais com maior incidência de casos prováveis de dengue este ano.
Segundo a pesquisa, a incidência de dengue e a temperatura mínima da atmosfera têm uma relação que os pesquisadores chamam de não linear (isto é, não aumenta igualmente uma para a outra). Dependendo da intensidade, essa variável pode ser fator de risco ou de proteção: o frio moderado e extremo funciona como fator “protetivo” e o calor moderado é associado a um maior risco de infecções.
A análise utilizou um levantamento de variação de temperatura média diária em um período de dez anos (de 2010 a 2019), em 66 microrregiões de Minas Gerais. No entanto, apenas 38 delas foram consideradas, uma vez que algumas não registraram casos de dengue suficientes para análise. Os dados dos casos de dengue são do DataSUS e os de clima são do ECMWF (Centro Europeu de Previsões Meteorológicas a Médio Prazo, em inglês).
A variação das temperaturas mínimas -geralmente registrada nas madrugadas- foi ampla: de 2,5 °C, em Pouso Alegre, no sul de Minas, a 26,5 °C em Frutal e Ituiutaba, ambas no oeste do estado. A incidência de dengue no período de análise foi menor em regiões com média de temperaturas mínimas diárias de 11,6 °C a 13,7 °C, classificadas como frio extremo e moderado pelos pesquisadores.
A incidência também diminuiu levemente em cidades com média de temperaturas mínimas diárias de 22,4 °C, classificada como extremamente quente pelos pesquisadores.
“As temperaturas mínimas são as mais utilizadas em estudos do tipo. A ideia é que por ser uma temperatura limítrofe, ela é correlata com as temperaturas mais quentes e ainda captura o efeito do frio, que pode ser limitante para o desenvolvimento do mosquito”, explica o coautor da pesquisa, João Pedro Medeiros.
As temperaturas influenciam tanto a sobrevivência do Aedes aegypti quanto a do vírus da dengue. Estudos anteriores já haviam mostrado que a faixa de temperatura ideal para o desenvolvimento do mosquito é de 16 °C a 34 °C. Em temperaturas do ar menores que 8 °C, as larvas do mosquito não se movem e morrem em poucos dias, enquanto o mosquito adulto fica incapaz de se mover em temperaturas menores de 10 °C.
Segundo Medeiros, no entanto, foi observado que a temperatura não agia da mesma maneira em todas as cidades, por existirem outros fatores que influenciam no número de casos, como acesso à saúde e a saneamento básico.
Variáveis como campanhas de educação e prevenção contra a dengue, tipo de urbanização, distribuição espacial de moradias, padrão de residência e mobilidade populacional foram pontuadas como fenômenos com o potencial de afetar a incidência da doença, mas não foram analisados pela pesquisa.
Outra variável importante para o estudo foi o tempo, que depende da biologia do mosquito, como reprodução, e da dinâmica epidemiológica, que consiste no tempo de incubação do vírus no vetor, a inoculação da dengue em um hospedeiro humano, a incubação no hospedeiro humano e a procura pelo serviço de saúde.
Para o pesquisador, o estudo pode servir para identificar regiões com maior risco de casos, considerando que há um caráter cíclico de epidemias de dengue. Nos dados apresentados, as epidemias se tornam mais intensas a cada três anos e há uma maior notificação de casos nos meses de dezembro e junho.
“Precisamos entender como funciona a dinâmica da doença para agir preventivamente e não esperar a onda de calor para que a gente comece a fazer a busca de focos do mosquito”.
Segundo pesquisa do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), as constantes ondas de calor decorrentes das mudanças climáticas associadas à urbanização incompleta e à grande circulação de pessoas em determinadas áreas estão favorecendo a expansão da dengue para o interior brasileiro.
De acordo com artigo do pesquisador Christovam Barcellos, a expansão da doença nessas regiões está diretamente associada à frequência cada vez maior de eventos climáticos extremos, como secas e inundações. O autor também cita a degradação ambiental, especialmente no cerrado, como importante influência.
Já existem evidências que o aquecimento global, causado pela atividade humana, tem causado um aumento de doenças infecciosas em todo o mundo, em especial as arboviroses, transmitidas por mosquito. Os registros de casos autóctones (que ocorrem no local e não são trazidos de fora) de dengue em alguns países da Europa, como no sul da França, Espanha e Itália, estão ligados diretamente à mudança climática, segundo pesquisadores da OMS (Organização Mundial da Saúde).
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