Os alertas de desmatamento na amazônia, que vêm caindo há meses, tiveram redução de 41,7% no primeiro trimestre de 2024, com perda de 491,8 km² de vegetação nativa, na comparação com 2023, quando a taxa foi de 844,6 km².
No cerrado, o índice cresceu 2% no mesmo período e chegou ao patamar mais alto da série histórica, iniciada em 2019, para os primeiros três meses do ano: foi de 1.416,9 km² para 1.445,6 km². A área perdida no cerrado neste ano até agora equivale à da cidade São Paulo (1.521 km²).
Os dados são do sistema Deter, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), e foram divulgados nesta sexta-feira (5). Os registros vão até o dia 28 de março para a amazônia e 29 para o cerrado.
Considerando apenas o mês passado, a taxa caiu 59% na amazônia, indo de 356,1 km² em março de 2023 para 146,6 km² neste ano, e aumentou 17% no cerrado, variando de 423,2 km² para 494,1 km² no mesmo período.
No início do ano, quando acontece a temporada de chuvas nos dois biomas, os números de desmate tendem a ser melhores do que no restante do ano, já que o tempo dificulta a atividade.
O céu nublado também dificulta a captura de imagens pelos satélites que alimentam o Deter. Em março, a cobertura de nuvens registrada pelo Inpe na amazônia foi de 30% e, no cerrado, de 23%.
O Deter mapeia e emite alertas de desmate com o objetivo de orientar ações do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e outros órgãos de fiscalização. Os resultados representam um aviso precoce, mas não são o dado fechado do desmatamento.
Os números oficiais são de outro sistema do Inpe, o Prodes, mais preciso e divulgado anualmente.
Em novembro, os dados do Prodes mostraram que, de agosto de 2022 a julho de 2023, foram perdidos 9.001 km² de floresta amazônica, uma redução de 22,3% na comparação com o período anterior. No mesmo intervalo, o cerrado perdeu 11.011,6 km² de vegetação nativa, representando uma alta de 3%.
André Lima, que chefia a secretaria extraordinária de Controle de Desmatamento e Ordenamento Ambiental Territorial no MMA (Ministério de Meio Ambiente e Mudanças do Clima), diz esperar que os resultados do Prodes deste ano sejam ainda melhores na amazônia, com queda de cerca de 50% no desmate.
“A fiscalização é fundamental. Sem ela, você não vai para o segundo degrau”, explica, afirmando que as outras ações do governo, como a restrição ao crédito para desmatadores, só são efetivas com fiscais atuantes.
Desde o início do ano, os servidores ambientais do governo federal estão paralisados, em uma reivindicação por reestruturação da carreira da categoria, com melhoria nos salários e nas condições de trabalho.
As negociações junto ao MMA e ao Ministério da Gestão e Inovação do Serviço Público seguem sem avanço aparente. Ainda não se sabe o efeito da paralisação sobre a política ambiental nacional.
“Acho que a gente vai começar a entender se esse impacto é maior ou menor a partir de agora, porque em janeiro, fevereiro e março a taxa de desmatamento está caindo, mas são meses, tradicionalmente, com o desmatamento mais baixo, por força da chuva”, diz o secretário. “Esperamos que a situação da fiscalização volte com força total nas próximas semanas ou meses.”
A redução no desmatamento na amazônia é a maior vitória na área ambiental do primeiro ano de governo Lula (PT), enquanto os sucessivos recordes no cerrado preocupam. Replicar os bons resultados de um bioma no outro, porém, não é algo tão simples.
Na amazônia, 54,3% da floresta está protegida por unidades de conservação e terras indígenas. Já no cerrado, dados da plataforma Mapbiomas apontam que somente cerca de 12% está em alguma área protegida, e as propriedades privadas ocupam 67%.
Nas áreas particulares também há uma diferença de legislação: segundo o Código Florestal, no cerrado é possível desmatar até 80% do terreno (ou até 65% em alguns locais, em locais de transição para a floresta amazônica). Na amazônia, o limite é de 20%.
Assim, como as autorizações para desmate são concedidas pelos governos estaduais, é preciso que estes entes atuem de forma coordenada para controlar a perda do cerrado.
No último dia 27, o governo federal chamou governadores da região para uma reunião no Palácio do Planalto para propor um pacto de combate ao desmatamento no cerrado. Foram sugeridas iniciativas como a criação de uma força-tarefa conjunta, integração de bases de dados e a definição de municípios prioritários para ações de fiscalização.
“Na amazônia, o governo federal tem um poder de ação muito maior. No cerrado, são os estados que têm um poder de ação maior. Mas isso não impede que tenhamos uma ação conjunta”, afirmou a chefe da pasta ambiental, Marina Silva, após o encontro. “Nós fazemos política pública pensando no que diz a ciência. E a ciência diz que a capacidade de suporte dos ecossistemas deve ser respeitada. “
Estiveram presentes os governadores Mauro Mendes (Mato Grosso), Eduardo Riedel (Mato Grosso do Sul), Ronaldo Caiado (Goiás), Romeu Zema (Minas Gerais), Wanderlei Barbosa (Tocantins), Carlos Brandão (Maranhão), a vice-governadora Celina Leão (Distrito Federal) e o secretário de Meio Ambiente da Bahia, Eduardo Sodré.
No primeiro trimestre deste ano, os estados que registraram maior perda de vegetação nativa no cerrado foram Tocantins (400,5 km²) e Maranhão (392,4 km²), Piauí (182,8 km²) e Bahia (163,9 km²). Os quatro compõem a região conhecida como Matopiba, que é simultaneamente uma fronteira do agronegócio e a área mais preservada do bioma.
Na amazônia, o estado líder em desmate no período foi Mato Grosso, com 132,7 km², seguido por Roraima (115,1 km²) e Pará (108,5 km²).
Os primeiros três meses do ano também tiveram altos índices de queimadas. Na amazônia, foram registrados 7.861 focos, e o cerrado teve 3.645. A alta foi de 180% e 67%, respectivamente, na comparação com 2023.
Mais da metade (52%) das ocorrências na floresta amazônica no primeiro trimestre aconteceram em Roraima, com 4.090 focos. O estado teve uma explosão de incêndios florestais em fevereiro, deixando vários municípios, inclusive a capital, Boa Vista, cobertos por fumaça. No cerrado, a maioria dos focos (1.044) ocorreu em Mato Grosso.
Os 1.806 focos registrados no cerrado em março bateram o recorde para o mês da série histórica do programa BD Queimadas, do Inpe, iniciada em 1999. O período mais crítico para o fogo no bioma, no entanto, vai de agosto a outubro, durante a seca, quando os índices chegam ao patamar das dezenas de milhares de focos.
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