O presidente Lula (PT) usou um encontro com o principal diplomata do Vaticano para ressaltar que seu governo defende a liberdade religiosa. Trata-se de mais um aceno do petista a grupos religiosos, em meio a dificuldades nas pesquisas com esse segmento.
O presidente recebeu, no Palácio do Planalto, o cardeal Pietro Parolin, que é secretário de Estado do Papa Francisco. Parolin realiza a primeira visita solo de um secretário de Estado do Vaticano ao Brasil desde 2000.
Após o encontro, Lula publicou uma foto ao lado do cardeal.
“Recebi o secretário de Estado do Vaticano, Cardeal Pietro Parolin, no Palácio do Planalto. Conversamos sobre os esforços do governo federal no combate às desigualdades e à fome e ações nesse sentido durante a liderança do Brasil no G20. Também concordamos com a importância de os governos garantirem a liberdade religiosa e os direitos dos povos indígenas”, escreveu o presidente.
Em nota divulgada após a reunião, a Secom disse que o presidente elogiou o papa Francisco como “um dos grandes líderes do mundo que têm se colocado contra a guerra e a desigualdade”.
“Ambos concordaram sobre a importância de os governos garantirem a liberdade religiosa”, prossegue o comunicado.
O texto diz ainda que o cardeal expôs interesse do Vaticano na situação dos povos indígenas no Brasil. Sobre esse tema, Lula citou a criação do Ministério dos Povos Indígenas e a demarcação de terras, entre outros pontos.
O encontro foi acompanhado pelo assessor especial de assuntos internacionais, Celso Amorim, e a primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja.
Liberdade religiosa é um termo que virou alvo de disputa nos últimos anos. De um lado, grupos mais conservadores dizem que esse princípio garante que líderes religiosos podem defender nos templos determinados dogmas –como o tratamento da homossexualidade como pecado– sem interferência do Estado ou risco de responsabilização.
Do outro, aliados de Lula lembram que foi o petista que assinou, em 2003, a Lei de Liberdade Religiosa. A norma estabelece a livre criação, organização, estruturação interna e funcionamento das organizações religiosas, “sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento”.
Essa ação de Lula em seu primeiro mandato foi usada por aliados na campanha de 2022 para rebater acusações de bolsonaristas de que o petista fecharia igrejas caso fosse eleito.
De acordo com interlocutores, o tema liberdade religiosa surgiu na reunião de Parolin com Lula no contexto da discussão sobre o atual estágio de um acordo firmado com o Vaticano em 2008. O tratado estabeleceu o estatuto jurídico da Igreja Católica no Brasil.
O petista, de acordo com interlocutores, destacou a mudança do perfil religioso da sociedade brasileira nas últimas décadas, com a diminuição do número de pessoas que se declaram católicas. Afirmou ainda ao emissário de Francisco ser contra a instrumentalização da fé para fins políticos.
Desde o ano passado, Lula vem sendo aconselhado a se aproximar de lideranças religiosas da sociedade, principalmente evangélicos. O presidente vinha até aqui resistindo a essa possibilidade, sob o argumento de que não queria misturar política com religião.
Os apelos para que ele acene ao público religioso aumentaram com a divulgação de levantamentos de opinião que mostraram dificuldades na avaliação do governo. A principal preocupação do Planalto não é com católicos, mas com evangélicos.
Na última pesquisa do Datafolha, 33% consideram a gestão Lula ruim ou péssima, contra 30% na pesquisa anterior, demonstrando oscilação negativa. Um recorte específico junto ao público evangélico mostra que a reprovação, antes de 38% em dezembro, subiu no terceiro mês de 2024 para 43%.
Aliados do Planalto no mundo evangélico nas últimas semanas estiveram com ministros e levaram o recado de que, na toada em que está o governo, a tendência é de piora nas pesquisas. Segundo eles, nesse ritmo pode ser que fique difícil construir uma reaproximação. Em ano eleitoral, o cenário é visto com ainda mais cautela.
A conversa levou a uma inflexão no núcleo do governo. Na última quinta-feira (4), Lula fez um discurso em que repetiu as palavras “Deus” ou “milagre” uma vez por minuto.
A fala foi feita de improviso, mas ocorreu após conversas com aliados.
O diagnóstico de interlocutores de Lula é o de que o chefe do Executivo é “um homem de fé”. Mas, de acordo com eles, Lula precisa usar discursos públicos para deixar mais claro a influência cristã na sua vida.
Em outra frente, o governo Lula pretende mobilizar a Esplanada dos Ministérios na missão de reagir contra a crise de popularidade entre os religiosos. Ministros de diferentes áreas serão escalados para reuniões com líderes evangélicos.
A expectativa, segundo interlocutores de Lula, é a de que as agendas sirvam também como uma antessala para eventuais encontros do próprio presidente com lideranças de grandes igrejas.
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