Relatório Gestão do Fogo na Amazônia também aponta a inclusão de saberes tradicionais como uma das medidas para um melhor combate às queimadas.
Ampliar a colaboração entre instituições e incorporar práticas tradicionais na formulação de políticas de manejo do fogo podem aprimorar o combate às queimadas, aponta o Diagnóstico da Gestão do Fogo nos Estados da Amazônia Legal. O levantamento reúne, pela primeira vez, dados sobre combate, manejo e controle das queimadas em todos os estados da região. O estudo foi coordenado por pesquisadores do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), com base em entrevistas realizadas com 122 gestores da área de fogo na Amazônia Legal.
A publicação surge em um contexto de fortalecimento das políticas públicas, como a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo (Lei nº 14.944/2024), e de reforço das ações de prevenção após os recordes de queimadas registrados recentemente. Em 2024, mais de 30 milhões de hectares foram atingidos pelo fogo em todo o Brasil, dos quais 25 milhões (82%) estavam localizados na Amazônia Legal.
“Acho que estamos mais preparados do que estávamos antes. Infelizmente, diante da magnitude do que aconteceu em 2024, ainda não é suficiente para enfrentar um cenário semelhante. Também não tivemos oportunidade de testar plenamente as novas políticas, mas podemos afirmar que a gestão e o manejo do fogo estão hoje mais estruturados do que no ano passado”, destacou Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM e uma das autoras do estudo.
Nos primeiros meses de 2025, os resultados têm sido positivos, com uma queda histórica na área queimada em todos os biomas brasileiros. Segundo dados da rede MapBiomas Fogo, da qual o IPAM faz parte, 4,2 milhões de hectares queimaram no Brasil entre janeiro e agosto, uma redução de 63% em relação ao mesmo período do ano anterior. Na Amazônia Legal, foram 3,1 milhões de hectares, o que representa 65% a menos do que em 2024.
Manejo Integrado do Fogo
Durante a elaboração da PNMIF (Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo), foram incorporadas práticas tradicionais de povos e comunidades da região que, há séculos, convivem com o uso seguro e sustentável do fogo em suas roças. O emprego de queimas prescritas e autorizadas durante o período seco, por exemplo, é uma das estratégias centrais do manejo integrado, justamente para evitar incêndios de grandes proporções.
No entanto, diante da vasta extensão da Amazônia Legal e da diversidade de vegetações existentes nesse território, o diagnóstico produzido pelas pesquisadoras defende uma capacitação mais ampla e contínua. Segundo o estudo, a política precisa ser compreendida de forma integrada e deve incluir práticas de planejamento que ultrapassem o controle emergencial de queimadas descontroladas, momento em que os riscos e os custos são significativamente maiores.
“É importante entender que o MIF traz uma abordagem que vai além das políticas de combate aos incêndios florestais. Ele atua de forma abrangente sobre a prevenção, o ordenamento do uso regular e o reconhecimento do uso tradicional e adaptativo do fogo”, explica Jarlene Gomes, pesquisadora do IPAM e uma das autoras do diagnóstico.
Bombeiros
Apesar da melhora nos resultados, influenciada também por um ano com temperaturas e secas menos extremas do que em 2024, o combate ao fogo na Amazônia Legal ainda enfrenta grandes desafios, principalmente devido ao efetivo insuficiente de brigadistas. Essa limitação é agravada pela ampla extensão territorial da região e pelas dificuldades logísticas e de locomoção.
O Corpo de Bombeiros de cada estado da Amazônia Legal conta, em média, com um efetivo de 1.116 militares, número significativamente inferior ao observado em outras regiões do país. No Amazonas, por exemplo, há em média um militar para cada 141 mil hectares, enquanto no estado de São Paulo a proporção é de um profissional para cada 3 mil hectares.
Além disso, o contingente disponível não está distribuído de forma equitativa. Dos 808 municípios localizados nos nove estados da Amazônia Legal, apenas 130 possuem unidades operacionais do Corpo de Bombeiros Militar. Em 2023, as brigadas do Prevfogo (Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais) atuavam em 58 municípios, enquanto as do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) estavam presentes em apenas 26. Outros 52 municípios contavam com brigadas voluntárias.